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Quando a porta se abriu, perguntaram-lhe o nome e com um gesto fizeram-na percorrer um corredor comprido e escuro. Sempre em silêncio, indicaram-lhe uma cadeira para se sentar, no que parecia ser a sala de espera. Fria e quase despida de mobília. Olharam uma para a outra mudas. Não se atreviam a falar, já estava tudo dito e tudo decidido. Restava-lhes esperar pela "sua vez". E ter esperança de que tudo corresse bem.
Ele, o namorado, esperava na rua.
Tinham avisado:
- Nada de homens, se quiser pode trazer uma acompanhante.
Enquanto ali estava, só conseguia pensar que estava a pôr em risco a sua liberdade e até a própria vida. Teria dores, hemorragias? Se algo corresse mal, não tinha hipóteses de ser assistida, naquela casa onde "só" faziam abortos clandestinos. Pensou na mãe que nem sonhava que ela estava a passar por aquilo. Não pensou no filho que não queria. Pensou em si. Mulher jovem, solteira, a cometer um crime à face de uma lei, que os homens e a Igreja teimavam em impor às mulheres.
Finalmente chamaram-na. Entrou naquele quarto, onde estava uma mulher vestida de branco, uma maca, uma mesa com uns quantos instrumentos, que ela preferiu não "ver", uma bacia e uma cadeira.
A primeira pergunta que ela fez foi:
- Vou ser anestesiada?
Lembra-se que lhe colocaram uma espécie de máscara, como a dos pintores. Lembra-se de ouvir um som, como se fosse uma torneira a pingar. Lembra-se do pavor que sentiu. Mais nada!
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Quando começou a acordar, viu a mulher vestida de branco.
Disse-lhe que tinha corrido bem, mas...
- A menina tem o útero torto, sabia?
- Eu não, respondeu ela
- Por isso, tem que vir cá amanhã, para eu ver se ficou tudo limpinho.
- Não pode ver isso, hoje? Agora?
- Não!
Sentiu-se impotente, aterrorizada. Pagou e saiu daquele último andar de um prédio antigo de Lisboa, a chorar enquanto descia as escadas. Teve que se recompor uns minutos antes de ir para a rua.
Não podia dar nas vistas. O namorado percebeu que algo não estava bem. Só lhe contou quando se sentiu a salvo, em casa da amiga.
Foi como se tivesse feito dois abortos. No dia seguinte, lá estavam de novo, aqueles dois jovens e a amiga de ambos. Clandestinamente perdidos e amedrontados.
A "senhora" de branco recebeu-a com maus modos e apressadamente. Quase sem anestesia, deitada naquela maca, ela apercebeu-se de tudo. O pavor que sentia era tal, que nem se lembra de ter tido dores.
A certa altura, ela ouviu " que já estava tudo bem".
Vestiu-se. Saiu sem olhar para trás. Jurou a si própria que tudo faria, para nunca mais ter de passar por aquilo, daquela forma.
Não foi presa, não ficou estéril, não morreu.
Mas nunca esqueceu!
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(Quando decidiram os dois, já casados, que era a altura certa - tiveram um filho, amado e desejado)
Teresa E
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